Mãe Clarice Lispector disse num dos seus escritos (que não tenho em mãos agora) que não há como fugir da carência. A carência está aí, está posta, nos cerca, nos atravessa, nos consome. É algo inerente ao espírito humano, é o que faz de nós humanos numa medida, bem como nos move em outra. Segundo Lispector, a carência não pode ser ignorada, nem subestimada. Não é algo desprezível (normalmente os homens desprezam mulheres visivelmente carentes, já ouvi alguns declararem ter nojo, como se neles não houvesse carência. Mas sempre tenho dúvidas sobre de que matéria são feitos os homens...isso é outro assunto), mas também não é algo superestimável. É algo nosso e merece ser cuidado com carinho.
Sou carente. E como disse, um dia ouvi um homem dizer que sente nojo das mulheres carentes. Isso me caiu muito mal na alma, porque embora e não estivesse se reportando a mim, transversalmente me agredia. Sou carente e ora lido bem, ora lido mal com as minhas carências. Normalmente as chicoteio. Outras vezes sou autocomplacente e faço grandes bobagens. Sou carente e desejo pessoas que não deveria desejar mais, ligo, escrevo, sinto vontade de ver, sonho com...e me chicoteio no final do dia. A carência em meu caso é uma espécie de flagelo. Porque ela me coloca em situações minimamente constrangedoras. Como um viciado, que rouba, se prostitui, vende a mãe para ter insumos para alimentar seu vício. A minha carência me faz adicta. Rastejando em torno das coisas que preciso.
E como disse, me chicoteio no final do dia.
Um passo feliz que dou de vez em quando é reconhecer: sou carente mesmo, mas não posso deixar a carência ser mais forte que eu. Como tia Clarice também disse "eu sou mais forte que eu". Se sou mais forte e minha cabeça vem em cima do meu coração, preciso pelo menos entender meus mecanismos, tentar mapea-los e compreendê-los (quando não evitá-los, que é o melhor dos passos).
Ligar para os ex é sempre um gesto de carência extrema. Não aguento, ligo. Me estapeio literalmente quando desligo o telefone, mas na seqüência alguns raciocínios ajudam a entender o gesto: faço por carência, por precisar ouvir aquela voz masculina, por uma aposta em algum cavalo já apostado na corrida. Mas muito pouco é por amor, é por paixão. Maior parte é por carência. Como disse, a tal muitas vezes nos coloca em situações minimamente esdrúxulas...
Dia desses senti vergonha. Fiz uma coisa que sabia que não devia ter feito, ignorando a minha própria prudência ou fiapo de orgulho. Fiz porque tinha uma esperança de que o cavalo pudesse correr tão rápido como das outra vezes. Não deu certo, ele refugou e eu me estapeei. Enterrei a cabeça no travesseiro.
Passou, porque depois de tomar uma dose de passiflora, me veio a consciência de que não era amor, de que não é paixão, nem um afeto assombroso. É só carência...e a tal me faz agir assim. Tudo sobre controle.
Mapeada a carência é reconhecer a sua existência, admitir e saber lidar com ela. Não sei lidar com a minha. Ela é meu mistério de esfígie, preciso decifrá-la antes que me devore. Mas hei de fazê-lo. Sou mais forte que ela.
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