segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Mulata Exportação

(Poema de Elisa Lucinda)

Mas que nega linda
E de olho verde ainda
Olho de veneno e açúcar!
Vem nega, vem ser minha desculpa
Vem que aqui dentro ainda te cabe
Vem ser meu álibi, minha bela conduta
Vem, nega exportação, vem meu pão de açúcar!
(Monto casa procê mas ninguém pode saber, entendeu
meu dendê?)
Minha torneira, minha história contundida
Minha memória confundida, meu futebol, entendeu,
meu gelol?
Rebola bem meu bem-querer, sou seu improviso,
seu karaokê;
Vem nega, sem eu ter que fazer nada.. Vem sem
ter que me mexer
Em mim tu esqueces tarefas, favelas, senzalas,
nada mais vai doer.
Sinto cheiro docê, meu maculelê, vem nega, me
ama, me colore
Vem ser meu folclore, vem ser minha tese sobre
nego malê.
Vem, nega, vem me arrasar, depois te levo pra
gente sambar.”
Imaginem: Ouvi tudo isso sem calma e sem dor.


Já preso esse ex-feitor, eu disse: “seu delegado...”
E o delegado piscou.
Falei com o juiz, o juiz se insinuou e decretou
pequena pena
com cela especial por ser esse branco intelectual...
Eu disse: “Seu Juiz, não adianta! Opressão, Barbaridade,
Genocídio
nada disso se cura trepando com uma escura!”
Ó minha máxima lei, deixai de asneira
Não vai ser um branco mal resolvido
que vai libertar uma negra:
Esse branco ardido está fadado
porque não é com lábia de pseudo-oprimido
que vai aliviar seu passado.
Olha aqui meu senhor:
Eu me lembro da senzala

E tu te lembras da Casa-Grande
e vamos juntos escrever sinceramente outra história
Digo, repito e não minto:
Vamos passar essa verdade a limpo
porque não é dançando samba
que eu te redimo ou te acredito
“Vê se te afasta, não invista, não insista!
Meu nojo!
Meu engodo cultural!
Minha lavagem de lata!
Porque deixar de ser racista, meu amor,
não é comer uma mulata!


quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Um eco, algum grito...

Não sei qual é o valor dessa minha voz em meio a tantas outras. Em meio à banalidade da vida, da mão cortada, do corpo violentado, do xingamento, do grito. Não sei qual é o valor. Talvez seja só mais um eco, mas enfim, deixo o meu. Essa expressão, ainda que seja vã.
Não consigo me conformar com o dado alarmante de que todos os dias uma mulher, uma garota, uma velha, uma irmã sofre algum tipo de violência sexual. Seja da bolinação que se faz de boba, seja do ato emsi, da sediciação, sodomização ou tudo que se incorpora a violência em nome de um prazer animal. Não consigo me conformar, até porque qualquer notícia dessa me dói na carne, como uma mão violentamente espalmada.
Na manhã de ontem, uma moça (que podia ser eu, ou tantas amigas e colegas que estudam no Campus da UFBa), foi brutalmente violentada porque não tinha dinheiro nem pertences valiosos para dar para o ladrão bestial. Para não sair perdendo tempo, por assaltar alguém sem posses, ele roubou dela o que tinha de mais precioso, o seu viço, a sua dignidade.
Aí abro o jornal e leio que uma menina de 9 anos era abusada por um adolescente de 15 anos e por um homem mais velho. Ao descobrir que seu filho abusava da neta de sua esposa, o velho se sentiu autorizado a fazer o mesmo. Assim, a menina passou a viver nesse cotidiano perverso, saciando o prazer escroto de dois seres animais. Sim, porque os homens transitam no mundo como animais. E como tal, nos enxergam como alimento para sua sede animal. Saciar essa sede vem primeiro. A humanidade, a dignidade, o respeito pela pessoa é mero detalhe. Não mata sede.
E isso me dói, porque é todos os dias, em toda a parte e eu sinto medo. Um pavor paralisante. E sinto uma impotência imensa. Que posso eu fazer diante disso? Que posso eu fazer para impedir que todos os anos 125 mil irmãs que vivem em Salvador sofram abusos? Que eu posso fazer para impedir que esses absurdos se repitam a cada 15 minutos (no Brasil, é o tempo de realização de atos de violência contra mulher)?
Mas é isso. Está no hábito. Está no entendimento. Está na cultura. Somos algum buraco. Somos um prazer pro corpo do outro. Somos qualquer coisa. Uma loira num anúncio de cerveja. Uma negra de bunda farta. Não sou qualquer coisa. Não somos...como fazer esses animais verem que somos gente. E que eles, por incrível que pareça, também o são.

terça-feira, 15 de julho de 2008

Sim, eu sou feminista. Sou mesmo. Desavergonhadamente feminista. E não tenho que me envergonhar disso: por que eu, mulher, classe baixa, negra, periférica, nordestina deveria defender um modelo de comportamento, direito e pensamento que em nada me privilegia? Ao contrário, rebaixa, diminui, incapacita.

Sim, e estou feroz. Embora já tenha feito elegias aos homens, embora seja uma mulher que escreve poemas para seus amados, faz desenhos para aqueles que deseja, compra presentinhos, faz almoço e se precisar passa roupa, eu ando impaciente com os homens. Impaciente com os enquadramentos que são dados pelos homens, com a falta de descuido e a eterna prepotência.

E quando em algum momento esbravejo, um deles responde com desdém "hum, ela é feminista". Como se isso fosse uma ofensa! Ora, sou mesmo. Não posso concordar que uma mulher seja puta porque gosta de gozar. Não posso concordar que uma mulher seja otária só porque ela não está disposta a "dar" para determinado cara. Não posso aceitar ser tratada com indelicadeza porque não sou branca e gostosa para o padrão dele. Não posso admitir que o fato de eu andar na rua habilite o sujeito a me passar a mão no seio. Não posso deixar de torcer para que a mulher traída dê um belo corno no marido, que garanhão varre meio mundo. Não posso admitir que um sujeito me torça o braço porque quer que eu dance com ele. Não posso deixar de sentir nojo quando vejo uma mulher defender um patriarcado que não é seu. Não posso deixar de aplaudir uma mulher que se impõe. Não posso deixar de esbravejar quando vejo uma mulher negra ser tratada como mula. Não posso admitir que uma reclamação minha seja considerada irrelevante porque sou feminista, e como qualquer feminista, sou azeda, mal-comida e coisas do gênero. Gozo todos os dias, graças ao bom deus.

Sim, sou pelo direito de uma mulher ser o que ela quer. Inclusive dela se defender e defender as parceiras. Porque ao longo da história, nossa função foi defender o homem, o desejo do homem. Lutar para ter o homem pra si. Que se foda, se torcem o nariz pro feminismo. Feminismo é necessário. Sou filha de uma geração de mães solteiras. Cresci numa casa de mulheres que criaram sozinhas seus filhos. Boa parte das minhas amigas não têm pai. Algumas delas, têm filhos, cujos pais, pouco se lixam. Moro numa cidade, que no carnaval o corpo da mulher é coisa pública. Já fui chamada de puta, por não beijar alguém que nunca vi pela obrigação de saciar um desejo que não é meu. Na rua onde moro, uma senhora de 60 anos quase foi estrupada por um garoto que também tentava roubar sua televisão. Acabei de saber, que a cada 15 minutos uma mulher sofre violência sexual no Brasil. E me justifique agora: por que eu não devo ser feminista? Por que devo defender o direito de quem me oprime?

Aguardo bons argumentos.

segunda-feira, 16 de junho de 2008

A maternidade

Ver os olhinhos quase abrindo daquela menina me causou uma emoção diferente. Uma alegria e uma ternura que vivem em mim e nem sempre tenho contato. Ela tem os olhinhos miúdos e castanhos e a pele rosada. Uma vida que acaba de começar nessa vida. Tantos aprendizados, tanta fragilidade. A natureza é meio milagrosa, assustadoramente milagrosa. E completamente embasbacada eu assisti aquele espetáculo da vida recém vivida, acabando de começar.
A minha amiga, que depois de tanta jornada de encontros, desencontros, moços bons, moços maus, moços confusos, outros tanto cafagestes, enfim, encontrara um homem leve e amor tranquilo, que sem desculpas ou rodeios se aprochegara a ela e lhe fizera uma filha. A tal menina que vi mexer na barriga cheia d'água da mãe e que agora estava ali, diante de meus olhos fazendo seus pequenos movimentos.
Ah, e tão lindo ver minha amiga, mãe. Ela que já vi desempenhando tantos papéis com tanta seriedade e disponibilidade, estava ali desempenhando aquele novo papel, talvez o mais doce de todos e o mais difícil: ser mãe. Mãe da pequena menina, que antes que meus olhos consigam se dar conta, já estará por aí a correr e a fazer perguntas provocativas. Ainda miúda ela anseia pelo bico do peito da mãe. Nenhuma das duas precisa de muitas lições para fazer o exercício que a natureza impeliu a mulher e a criança: nutrir uma a outra.
E diante desse milagre doce, que é a vida recém concebida, esqueço de todas as mazelas da humanidade, de todas as desumanidades. Aquela vida pedindo atenção, carinho, paciência e zelo aguçam e mim uma humanidade boa e que quero sempre por perto. A humanidade feminina de maternidade, de querer volver uma pequena ou pequeno nos braços e mostrar o bonito do mundo.
Ah, sim, quero essa alegria bonita. E já me vejo doida para ver de novo aquela pessoa em potencial, para vê-la chorar o choro agudo de quem ainda não forjou as palavras.
Sei pouco lidar com as crianças, elas me soam a algo difícil, que mexe talvez com meus fantasmas de criança. Mas me desperta também a mulher doce que há em mim. Que sonha com uma filha de grandes olhos e cabelo cheio, pele mestiça e lábios grossos, cheia de perguntas que eu não saberei, aquela mania de se esconder atrás da saia da mãe.
É fato, sonho com isso de ser mãe. De ser boa mãe. De ser doce mãe.
Parabéns a todas

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Não há como fugir da carência

Mãe Clarice Lispector disse num dos seus escritos (que não tenho em mãos agora) que não há como fugir da carência. A carência está aí, está posta, nos cerca, nos atravessa, nos consome. É algo inerente ao espírito humano, é o que faz de nós humanos numa medida, bem como nos move em outra. Segundo Lispector, a carência não pode ser ignorada, nem subestimada. Não é algo desprezível (normalmente os homens desprezam mulheres visivelmente carentes, já ouvi alguns declararem ter nojo, como se neles não houvesse carência. Mas sempre tenho dúvidas sobre de que matéria são feitos os homens...isso é outro assunto), mas também não é algo superestimável. É algo nosso e merece ser cuidado com carinho.
Sou carente. E como disse, um dia ouvi um homem dizer que sente nojo das mulheres carentes. Isso me caiu muito mal na alma, porque embora e não estivesse se reportando a mim, transversalmente me agredia. Sou carente e ora lido bem, ora lido mal com as minhas carências. Normalmente as chicoteio. Outras vezes sou autocomplacente e faço grandes bobagens. Sou carente e desejo pessoas que não deveria desejar mais, ligo, escrevo, sinto vontade de ver, sonho com...e me chicoteio no final do dia. A carência em meu caso é uma espécie de flagelo. Porque ela me coloca em situações minimamente constrangedoras. Como um viciado, que rouba, se prostitui, vende a mãe para ter insumos para alimentar seu vício. A minha carência me faz adicta. Rastejando em torno das coisas que preciso.
E como disse, me chicoteio no final do dia.
Um passo feliz que dou de vez em quando é reconhecer: sou carente mesmo, mas não posso deixar a carência ser mais forte que eu. Como tia Clarice também disse "eu sou mais forte que eu". Se sou mais forte e minha cabeça vem em cima do meu coração, preciso pelo menos entender meus mecanismos, tentar mapea-los e compreendê-los (quando não evitá-los, que é o melhor dos passos).
Ligar para os ex é sempre um gesto de carência extrema. Não aguento, ligo. Me estapeio literalmente quando desligo o telefone, mas na seqüência alguns raciocínios ajudam a entender o gesto: faço por carência, por precisar ouvir aquela voz masculina, por uma aposta em algum cavalo já apostado na corrida. Mas muito pouco é por amor, é por paixão. Maior parte é por carência. Como disse, a tal muitas vezes nos coloca em situações minimamente esdrúxulas...
Dia desses senti vergonha. Fiz uma coisa que sabia que não devia ter feito, ignorando a minha própria prudência ou fiapo de orgulho. Fiz porque tinha uma esperança de que o cavalo pudesse correr tão rápido como das outra vezes. Não deu certo, ele refugou e eu me estapeei. Enterrei a cabeça no travesseiro.
Passou, porque depois de tomar uma dose de passiflora, me veio a consciência de que não era amor, de que não é paixão, nem um afeto assombroso. É só carência...e a tal me faz agir assim. Tudo sobre controle.
Mapeada a carência é reconhecer a sua existência, admitir e saber lidar com ela. Não sei lidar com a minha. Ela é meu mistério de esfígie, preciso decifrá-la antes que me devore. Mas hei de fazê-lo. Sou mais forte que ela.

sexta-feira, 6 de junho de 2008

Menstruo desde os dez anos, assim que completos. São 19 anos de sangue. Sangue, cólicas, lágrimas, nervosismo e gemidos. Aos 11 anos tive uma das piores cólicas de minha vida. Lembro que deitada no colo de minha mãe, eu pedia para não morrer. Porque nunca tivera dor tão funda e insuportável até aquele momento. O sofrimento persistiu por anos a fio. Não somente no momento em que ela descia, mas dias antes: dores de estômago, enxaqueca e muito,muito chororô.
Sem contar que o sistema imunológico costumava sair de férias, sempre que a amiga menstruação dava sinal de aproximação. Nessas momentos tive rubéola, dengue, catapora, depressão e o que ocorrer...
Assim fui tomando um certo horror de minha menstruação e estudando como diminuir seus impactos sobre a minha vida. Sim, porque eram impactos, bastante sofridos. O fato foi que aos 27 anos, eu decidi dar um basta nas agonias, vômitos, quedas de pressão, cólicas e diarréias mensalmente provocadas pela parceira. Adotei o esquema do anticoncepcional trimestral. Com ele tenho sido feliz há quase que dois anos.
Depois de tanto tempo, dei uma segurada no uso do remédio. Fui pra Chapada Diamantina e percebi que todas as mulheres me olhavam com certo espanto por eu optar por suspender minha menstruação. Comecei a achar que aquilo não devia ser bom. Que alguma coisa de errada eu estava fazendo com meu corpo.
Esse ano ainda não tomei minha santa injeçãozinha. Na última terça-feira, tive um acesso de choro. Uma resposta fria de um ex-caso foi o suficiente para eu me debulhar em lágrimas e me sentir a pior das mulheres. Feia, insossa, desprovida de atributos sexualmente interessantes, impossível de ser desejada, querida, amada. Ninguém no mundo olharia para mim. Chorando liguei pra uma amiga. Chorando fui para a academia. Chorando saí do meu ensaio, me sentindo ainda mais feia, mais desprezível, ainda acrescentando os dados de que não era também uma boa atriz. Fui dormir com o travesseiro molhado de tanto chorar. No dia seguinte, tinha meu lençol manchado. A menstruação descera. E com ela se apaziguara aquela dor toda, que não era necessariamente o que é a vida, mas a nuvem da tensão pré-menstrual.
Não sei. Por um lado sentia falta desse rio que corre pelo corpo. Mas por outro me desagradou ver que tudo continuava como antes: se eu quiser voltar a menstruar regularmente, tenho que preparar meus lenços e pedir que o mundo tenha cuidado comigo, pois posso cortar os pulsos.

quinta-feira, 1 de maio de 2008

A mais forte


Jacyan Castilho é uma mulher admirável, com uma sensibilidade movida a sangue quente. Inteligente e divertida, esta atriz não tem medo de ser o que é, pessoa agridoce e criativa. Atriz, diretor, doutora em Artes Cênicas, bailarina, mãe, mulher, boa de papo, como se pode ver nessa entrevista. Leia, diverta-se e pense.


Eu - Quando você percebeu que não teria jeito, seria atriz?

Ela - Nunca percebi. Desisti mil vezes, achei mil vezes que não tinha jeito pra coisa, tentei mil vezes fazer outra coisa. Mas, se ainda estou aqui, é porque devo ter insistido umas mil e uma vezes...


Eu - Tem umas profissões que são meio glamurizadas, o ofício do teatro é uma delas. Em sua vida, há(ou houve) algum glamour em ser atriz?

Ela - Bom, costumava dar Ibope com os meninos (rsrs) - os meninos de fora do ramo, evidentemente. Arranjei alguns namorados com esse papo de "sou atriz...".

A família sonha em te ver na Globo, e, eventualmente,quando você aparece lá mesmo, o cara do bar da esquina fica orgulhoso por você e te exibe pros fregueses. Nesses dias, o café vinha mais quentinho.

Ou seja, fica todo mundo louco pra te exibir, e quando conseguem, você é bem tratada. Mas o meu dia a dia nunca foi glamouroso, sempre tive pouco dinheiro e muito trabalho. Glamour, mesmo, é quando a gente fica amiga de maquiador e cabeleireiro - aí é o máximo, porque já fui a festas muito linda e produzida carinhosamente pelos amigos, de graça!


Eu - Você se sente uma mulher forte? Às vezes, pessoalmente, acho essa história de ser mulher forte um barril da porra, porque simplesmente as pessoas acham que somos meio invencíveis, que suportamos tudo, temos a flexibilidade de uma borracha...acho isso barril...pessoalmente. Você se encara como forte ou pelo menos tenta ser? O que é ser uma mulher forte?

Ela - Sim, penso que sou forte, desde menina, mas tenho feito um looooongo trabalho pra deixar de ser. Porque, como você disse, isso é muito chato... quando era garota, e (achava que) tinha que provar meu valor, eu fazia questão de ser fortona, independente e cheia de iniciativas, em todos os campos, do pessoal ao profissional. Hoje trabalho duro para saber pedir ajuda, deixar que façam por mim, ser bem mulherzinha. E adoooooro quando me dão ordens! Aí não tenho que pensar, só executar, kkk!


Eu - Embora o ambiente de teatro seja dito um espaço "prafrentex", nos seus bastidores carrega os mesmos preconceitos e formas de relação de qualquer outro lugar. Logo, atores por mais polidos ou prafrentex que sejam, independente de orientação sexual, são machistas. Pelo menos percebo assim...na verdade, quero perguntar como dirigir homens, lidar com eles, sem ser um deles, sem deixar de ser feminina ou gostosa por isso? Você faz que para conseguir isso?

Ela - São machistas, sim, e o meio é preconceituoso, sem dúvida ne-nhu-ma. Minha fórmula infalível é: me faço de burra. Faço que não estou "entendeindo", finjo que não percebo indiretas, piadinhas, cantadas, interesses, puxadas de tapete e similares, e sigo em frente. Mas, na verdade, o fato é que, seja por sorte, seja por saber escolher as parcerias, eu não costumo ter problemas com os companheiros de vida e de trabalho ... eu sempre escolhi intuitivamente as pessoas pelo senso de humor. Quem não tem senso de humor não cola comigo.


Eu - Você acha que existe um padrão de pensamento feminino e um padrão de pensamento masculino? Acha que pensa de que jeito?

Ela - Ah, acho que tem diferenças, sim. E acho até bom que seja assim. Só que acredito, malgrado meu, que penso "masculinamente". Demorei até admitir que sou gostosa, me perdoe a falta de modéstia. Achava mais importante ser inteligente (hoje acho os dois muito bom). Não tenho muito saco pra conversa de mulher, a não ser as das minhas amigas inteligentes e bem humoradas. Mulher chatinha cheia de inha me cansa, vai daí que a maioria dos meus amigos é homem. Tirando aquelas baixarias de bunda e coisas assim, eu gosto da conversa deles. E me divirto muito, muito, muito, conversando com meu marido.

Eu - O que é liberdade para você? Acha que consegue viver aquilo que chama liberdade?

Ela - Aí vem a minha frase norteadora da vida, uma dita por Denise Stoklos num espetáculo que me marcou pra caramba, o "Um fax para Cristóvão Colombo": " A verdadeira revolução começa no espelho do banheiro". Penso que a liberdade mais difícil de ser conquistada é a criatividade nas relações pessoais, isto é: a liberdade de não ter de repetir os padrões de relacionamento de todo mundo, a liberdade de criar os seus próprios.Seja de marido/ mulher, patrão/ empregado, mãe / filho, professor / aluno, entre colegas de trabalho, artista / mercado, etc. Uma vez Bárbara Heliodora, crítica de teatro famosa lá do Rio que foi minha professora, falou uma coisa hilária em sala (ela é hilária!): Dói muito ser inteligente. Quando a gente é algum "ista" - flamenguista, comunista - a gente raciocina só que tudo ou é bom (o Flamengo, o comunismo) ou não é (o Fluminense, o capitalismo). Quando a gente é inteligente, está sempre pesando a situação, avaliando os prós e os contras, relativizando, se colocando no lugar do outro, sem tomar partido a priori. Isso dá muito mais trabalho! (Era mais ou menos isso, não me lembro bem). É isso! Eu acho que a liberdade dá trabalho. Não é à toa que tanta gente desiste e prefere ser mais um na manada.



segunda-feira, 7 de abril de 2008

Moda: de amiga a patroa

Nunca fui muito preocupada com peso. Até porque sempre estive abaixo do peso para minha altura. Hoje, beirando os 30 anos, estou também beirando o peso ideal. O que significa que eu preciso estar atenta, pois depois de ficar balzaca os hormônios vão mudando e nossa tendência de ireversivelmente engordar é grande. Ok, estou atenta e devidamente preocupada.
Mas veja só, além de minha preocupação com minha saúde e bem estar, a coisa não evolui muito. Não acho que eu seria menos gostosa se fosse um pouco mais cheinha. Sinto que no mundo das pessoas reais e normais, a magreza excessiva não é das coisas mais atraentes.
Pois então, um amigo me comentou que determinada loja de departamentos de um dos shoppings daqui de Salvador, pesa periodicamente suas funcionárias para verificar se estão dentro do enquadramento de peso. Caso contrário, o perigo da cabeça ser cortada é grande. Bem, se isso é verdade, eu realmente não sei, mas também, nesse mundo de calças centropeito nada me surpreende.
E esse papo introdutório todo é porque fiquei me perguntando para quem a moda é criada? Essa tal moda das tais fashion weeks é criada para quem, além de Alynne Morais e Giselle Bundchen? Não sei, mas me pergunto se ela é criada para as mulheres que vejo andando nas ruas, independente das classes sociais...mas não somos aquelas mulheres que desfilam nas passarelas e para quem as roupas são desenhadas. Moro numa cidade de mulheres de estatura baixa, tronco curto, pernas grossas, mulheres mestiças, muitas vezes mais rechonchudas, de quadris inevitavelmente largos. E essas calças centropeito, essas saias cintura altas...não sei, engolem essas mulheres...as tais pantalonas ficam tão estranhas em nós baixinhas...
Nesse mundo em que a obesidade é cada vezmais uma coisa comum às populações de um continente a outro, a imposição da anorexia como expressão da beleza é algo que vai na contramão. Se a função da moda é conferir beleza, bem estar, charme, estética, por que não ser pensada para os simples mortais, que não são esguios, altos e loiros. Por que não pensar uma moda que leve em consideração as consumidoras, em vez de impor um modelo que só atende a uma parcela tão pequena...
A moda mais me parece uma ditadura. Alguém que eu não conheço decide o que é bonito para ser usado, sem considerar a estrutura física desse povo, das mulheres desse país. Aí, você anda pelos shoppings e só encontra os modelos ditados pela tal figura sem nome. Claro, nem tudo é ruim na moda. Muito pelo contrário, há coisas charmosas, bonitas, que valorizam nosso corpo, nossa pele, nossos olhos, mas há também muita coisa que passa por cima das feições desse país.
Por exemplo, porque roupas para mulheres mais gordas não são jovens? Por que não pensar uma roupa que valorize o corpo dessa mulher? Por que temos que ter quadril estreito se a nossa mestiçagem está longe de propiciar isso: somos mulheres de quadril geneticamente mais largo. Por que não desenhar roupas que lidem com esse corpo? Ah e por aí vai...
Não aprecio a padronização. Usar o que está imposto também não é meu estilo. Uso o que gosto, o que fica bem em mim. O que cabe no meu estilo. O que me deixa bonita. Não tenho problemas em ser e estar diferente. Busquei isso e a vida me permitiu...pena que nem todas nós temos liberdade o suficiente para buscar e construir isso. A ditadura do padrão não costuma respeitar as individualidades e nem sempre somos tão convictas de nossas vontades para ousar.
Enfim...seja e use o que lhe convém.

sexta-feira, 28 de março de 2008

Conversa com o Girassol


Como disse, esse blog é despretensioso. E por isso faço entrevistas despretenciosas com mulheres que admiro. Mulheres cheias de alma, força, mas 
também divertidas, belas.
A primeira delas é essa daqui: Raiça.
Então, Raiça Bomfim é uma figura adorável. Quem conhece sabe, que não conhece pode conferir um pouco no seu blog, igualmente adorável (raibomfim.blogspot.com). Adorável por sua sensibilidade, bom humor, simpatia. Uma mulher que gosta de girassóis, enveredou pelo caminho do teatro e tem uma voz em franca ascenção.  Como todas as outras, caminha em busca de se conhecer e se entender nesse mundo estranho, 
mas também bonito.


Eu - Por que você gosta tanto de girassóis?

Ela - Primeiro eu gostava de dormir ouvindo a música "Girassol" de Alceu. Depois, quando fui fazer capoeira, o mestre me batizou de girassol. Eu achava tão bonito... Todo meu grupo de capoeira só me chamava assim. Criei meu primeiro e-mail na época usando o apelido e assim o título se alastrou para outros grupos. Depois, me deparei com algumas plantações de girassóis de umas cidades na chapada diamantina e fiquei abismada com toda aquela beleza e ainda mais lisonjeada por ter recebido aquela alcunha. Por fim, no início do meu terceiro ano do ensino médio, todo dia, antes de ir ao colégio, passava em frente a uma casa de um condomínio próximo ao meu, que tinha um jardim de girassóis (era fevereiro-março e eles estavam bem floridos). Assim, minha paixão por girassóis só crescia... Fazia bem estar atenta a esses seres que tem o sol como guia. Ainda nessa época, essa paixão quis se estampar na pele, e tatuei um girassol. São lindas as flores. Eu escolhi a minha musa.


Eu - Você já se olha no espelho e se sente mulher?
Ela - Sim... Ser mulher é fato. Difícil é ser a mulher que se quer, que se gosta de ser. São sempre diferentes as mulheres que me percebo no espelho. Nem todas, eu admiro. Muitas, não reconheço.


Eu - Como é ser uma jovem de 21 anos dotada de sensibilidade? Você é feliz sendo sensível?
Ela - Epa, agora eu tenho 22! Risos. E sensibilidade é uma forma de atenção. Deixar que a sensibilidade nos afogue demasiadamente em nós, é tornar-se insensível, desatento ao que nos cerca e tange. Isso é, sim, bastante intenso. É um tipo de cegueira que dilata o pouco que resta diante dos olhos e acaba sendo muito produtivo em termos artísticos. Como "felizmente" escolhi o teatro como ofício, nunca há o que lamentar. Tudo é matéria de trabalho. Mas a generosidade e liberdade do olhar em paz (a paz e todo seu silêncio são a felicidade que procuro) podem ser menos traduzíveis materialmente, mas acrescentam muito mais à alma. É aí que mora minha sensibilidade. Sim, sou feliz por ser sensível. E sou muito mais sensível quando estou feliz.


Eu - De que matéria são feitos os homens?
Ela - De uma matéria que muitíssimo me atrai, surpreende, enternece e impressiona, mas com a qual eu ainda espero aprender a misturar-me sem tanto maremoto, sem ser tão subtraída quando da separação.


Eu - O que te povoam os pensamentos quando você caminha para o ponto de ônibus?
Ela - Vixe, uma grandessíssima parte de tudo que penso, penso no ônibus. Até porque é lá que passo grande parte do eu dia. São os males (ou nesse caso restrito, quiçá, os bens) de se morar em piatã e ter todos os compromissos no centro.



Eu - Você se vê como aos 30 anos?


Ela - Mãe, com fé em deus. E mais madura, mais equilibrada, mais em paz, mais sábia, mais adiante nesses caminhos que desde muito tento trilhar.

domingo, 23 de março de 2008

Etiqueta Sustentável

Acordar é necessário. Ainda que demore um tanto, mas é preciso. Há pouco tempo comecei a acordar para a importância de mudar a minha postura com relação a coisas como lixo, consumo, sustentabilidade. Acho que já podia ter acordado para essas coisas antes, mas fui daquelas que achavam que se preocupar com meio ambiente é coisa só pra militante do Greenpeace ou pessoas preocupadas com a vida dos ursos polares. Os tempos são outros, não acordar para a nossa fome de consumo que nos consome é burrice.
E escrevo tudo isso do meu laptop, que acabei de comprar e que vai me render seis meses de endividamento. Agora passada a sanha de ter um computador para colocar debaixo do braço e dentro de um táxi (porque sou pedestre e andar de ônibus em Salvador é sempre uma aventura), me questiono da real necessidade de ter um laptop. Meu desktop é ótimo e atende às minhas necessidades. Vou ser altruista e passá-lo para minha irmã caçula, que não tem máquina em casa.
Tenho me questionado muito sobre a quantidade de vestidos que há no meu guarda-roupas. Inclusive decidi que não compro um guarda-roupas novo. Não consumo mais roupas, porque não há espaço no meu armário. Mas pra que tanta roupa? Tenho vestidos que só usei uma única vez. Outros que comprei há meses e nunca tive oportunidade de usar. Sede de consumo. Necessidade de sei lá o que.
Sei que se o mundo consumir como eu consumo, se exaurirá em três tempos. Ou melhor já está se exaurindo. O detalhe é que o meu poder de escolha de vida é condicionado pelo tanto que consumo. E não consumo pouco. Sou vaidosa, gosto de perfumes, cremes, da casa bonita e do que há de novo. Isso não é crime, mas o quanto me condiciono a isso? Esse é o pecado: o condicionamento. A escravidão a um sistema que nos escravida. Acorrentadas pelos cartões de crédito.
E os que se permitiram despertar para outras consciências hoje falam em etiqueta sustentável, que seria uma busca por mudança de comportamento, agindo de forma mais consciente. Essa etiqueta implicaria numa maior reflexão diante do ato de consumir: pensar algumas vezes antes de comprar, perceber a real necessidade da compra, evitar consumir produtos demais embalados e que geram montanhas de lixo, optar por reciclar as coisas que são passíveis de reciclagem, separar o lixo orgânico do não orgânico. Sem contar a preocupação com conhecer um pouco aquilo que está comprando: que materiais são usados? Tratas-se de um produto biodegradável? Que tipo de mão de obra é envolvida? É algo produzido de forma orgânica, sem agredir o meio ambiente? Bem, quando você se dá ao trabalho de se perguntar tudo isso, tem mais tempo de ver se realmente vai comprar e o que precisa.
Às vezes, um produto com essas preocupações não são os mais baratos. Mas quando a gente pensa de uma forma menos imediatista e mais preocupada com o futuro, com o mundo em que vivemos, com o nosso corpo, com o ambiente que é parte de nós... a gente acaba reconhecendo que vale a pena.
Uma dica é buscar mesclar as coisas. Um produto orgânico com um não tanto. Porque não vamos negar que no bolso há uma diferença, mas também no paladar. Uma rúcula orgânica tem um sabor indescritível...embora custe uns trocados a mais.
É isso, consumir diferente, estar no mundo de forma mais responsável, não só preocupada com seu quinhão é algo novo, diferente e que sim, dá trabalho. Etiqueta significa educação, bons modos, agir com coerência. E viver isso pensando em responsabilidade, sustentabilidade é buscar uma nova consciência, outra educação. O que exige tempo, paciência e disponibilidade.
O nosso planeta, a sua pele e as nossas vidas agradecem.

quarta-feira, 19 de março de 2008

Dica Zen...etcétera

O sal serve pra tanta coisa que sabe Deus. Nós, baianas, sabemos desde cedo que o tal é poderoso, mas naquela coisa de sabedoria popular senso comum. Dia desses vi um químico explicando o poder do sal como neutralizador de campos magnéticos. Mesmo, né superstição não. O especialista recomendava colocar sal grosso em pequenos recipientes em alguns campos da casa de maior concentração eletromagnética. Por exemplo, sobre o forno de microondas, sobre o computador, a geladeira. Todos esses campos são repletos de energia, muitas vezes, pouco sadia para nós pobres mortais. Com o sal grosso, dá pra dar uma filtrada nessa energia nociva liberada pelos equipamentos.
No campo das energias mentais humanas, para quem se permite crer, o sal também cumpre o mesmo papel de neutralizar energias. Mas há que se ter cuidado. Como ele neutraliza, ele neutraliza tudo, inclusive energia boa. Assim, no caso de um banho de sal grosso, vale a pena mistura-lo com ervas. A arruda cumpre o papel de junto com ele, limpar nosso campo energético de todas as vibrações que não nos servem. Se você acrescenta alecrim, seu corpo vai ser revivificado, com vibrações totalmente do bem.
Na Mundo Verde (momento merchandising sem desconto ou patrocínio), há uns potes ótimos de sal grosso já misturado com ervas. Você pode escolher a que te interessa e tomar seu banho.
Pessoa ansiosa que sou, sempre uso a mistura que traz folhas de camomila e cidreira. Própria para as pessoas aceleradas, né?
Vale a pena experimentar. Tanto o sal sobre os eletrônicos, como sobre a sua pele num bom banho quente e revigorante.

Sal não: no shampoo, gata. Evite! Quem tem cabelo seco (e crespo) deve tomar cuidado com os shampoos com sal. Eles ressecam nossos cabelos e devem ser substituídos pelas fórmulas sem sal.
No momento merchandising, eu recomendo a Linha Bioderm, é ótima! Sem sal, com queratina...hidrata e limpa uma beleza. Meus cabelos são extra-secos e se adaptaram muitíssimo bem ao produto.
Esse blog não se propõe a definir o que é ser mulher. Nem tampouco discutir o que é ser mulher. Ser mulher é ser humano. E ser humano não se define. Não se molda. Se é sendo. Há pistas do que seja ser. Mas se é. Não se explica. Já dizia uma mulher que muito gosto, explicar é reduzir. É ela Clarice Lispector, mulher da mais mulher que conheço, amo, admiro e me assusto.
Aqui é um ambiente para se falar. Ora vai ser salão de beleza. Ora vai ser consultório. Ora sala de aula de pós-graduação. Porque eu sou assim. Ora inteligente. Ora me preocupo em salvar o mundo. Logo na seqüência só quero a salvação das minhas pontas duplas. E nesse momento, eu parei de escrever para conferir a sua situação.
Estão abertos os trabalhos desse blog.